sábado, 5 de abril de 2008

O preço das escolhas





Nobreza ou covardia? O que leva alguém a abrir mão de um amor daqueles que só acontecem uma vez na vida? Sou uma romântica irremediável e morro toda vez que assisto à cena final de “As pontes de Madison”. Caso você não tenha visto o filme ainda, decida agora se quer mesmo ler esse post, pois não pretendo te poupar de nenhum detalhe magistralmente incluso no desfecho desta obra-prima do cinema.

Há quem ache que “As pontes de Madison” não passa de mais um filme meloso, banal e piegas. Eu, no entanto, o tenho como meu favorito - ontem, hoje e sempre - não só pela carga dramática da história e pela intensidade com que ela é contada, mas, principalmente, pela sensibilidade do diretor, Clint Eastwood, que consegue comover o mais duro dos corações de forma sutil, singela e incrivelmente bela.

No filme, o velho Clint interpreta Robert Kincaid – um fotógrafo da revista National Geografic que chega ao Condado de Madison (Iowa/EUA) para registrar as pontes cobertas do local e, lá, acaba encontrando o verdadeiro sentido de sua existência em Francesca Johnson, uma pacata dona de casa de origem italiana cujos sonhos estavam adormecidos pela rotina de cuidar do marido e dos filhos adolescentes sem ser notada em sua essência.

Nada mais inconcebível, não? Um cara que já rodou o mundo inteiro, que conheceu mil pessoas “interessantes”, que viu tudo e mais um pouco, se apaixonar por uma mulher que, aparentemente, nada tinha a lhe acrescentar. E é aí que está outro grande mérito do filme. Os personagens e diálogos são tão bem construídos que o espectador consegue não só compreender perfeitamente o que está acontecendo, como sentir na pele todo o encantamento que ilumina e toda a angústia que corrói os protagonistas.

Na manhã em que Robert chega ao condado, Francesca está só. O marido e os dois filhos do casal foram participar de uma exposição de animais num condado vizinho e só voltariam quatro dias depois. Robert tem dificuldade de encontrar uma das pontes que foi fotografar e resolve pedir informação a uma das poucas almas vivas que encontrou no local – uma senhora de meia-idade, de cabelos desgrenhados e aparência cansada, que varia a varanda de casa.

Francesca não tarda a cair de amores por aquele homem charmoso, gentil, divertido, que a enxergava como um raio de luz por entre as árvores secas. Os dois acabam se envolvendo. A leveza do começo, no entanto, vai dando lugar a um tormento crescente. Eles sabiam que, enquanto o amor se agigantava, o tempo que tinham para ficar juntos era cada vez menor. Francesca, no auge de sua insegurança e desespero, agride Robert, dizendo que ele vai esquecê-la assim que deixar o Condado e receber uma nova pauta da revista, enquanto ela terá que viver das lembranças daquele amor até o fim dos seus dias naquele lugar onde nada acontecia. Nesse momento, ele olha no fundo dos olhos dela e acaba de vez com qualquer resquício de dúvida, respondendo com a voz embargada e absoluta convicção: “Como assim? Tenho certeza de que tudo que eu vivi até hoje só aconteceu pra que eu chegasse aqui”.

Quatro dias se passaram. A família de Francesca está prestes a chegar. Robert hospeda-se numa pousada, enquanto aguarda a decisão da mulher da sua vida. Partirá com ele sem olhar para trás ou ficará com o marido e os filhos para poupá-los das consequências desse abandono? “Eles não sobreviveriam à fofoca. E eu, à culpa”, disse ela, numa de suas conversas com Robert sobre a possibilidade de fugir.

Extremamente abatido, com o coração em frangalhos, Robert desiste de esperar e resolve ir embora. Na saída da pousada, sob uma forte chuva, ele vê Francesca dentro de um carro estacionado, no banco do carona. Ela também o vê. Ele permanece sob a chuva durante alguns segundos, de pé, de frente para o carro, olhando-a fixamente. Ela chora. O marido chega com as compras, senta-se no banco do motorista e pergunta o que ela tem. Robert entra na sua caminhonete e dá partida. O marido também sai com o carro, logo atrás. O sinal fecha. A chuva cai ainda mais forte.

Esse é o grande momento do filme. Francesca tem a última chance, enquanto a luz do semáforo está vermelha, de deixar aquela vida infeliz e ganhar o mundo com Robert. Ela chega a segurar a maçaneta fria da porta do carro, mas falta-lhe forças para abri-la. Robert percebe tudo, resigna-se e (preparem-se) coloca uma corrente com um crucifixo que ela lhe deu de presente presa ao retrovisor, como uma forma de mostrar para Francesca que ela estará para sempre com ele, onde ele for. O sinal abre, ele pega a estrada, ela o acompanha com o olhar até a caminhonete sumir no horizonte. A dor é absoluta.

Muitos anos mais tarde, com a morte de Francesca, seus filhos, já adultos, têm acesso aos diários da mãe, que são deixados como herança. Nestes cadernos, Francesca conta tudo que aconteceu entre ela e Robert (o filme se passa em flash back). Estupefatos, os filhos acabam compreendendo a dimensão daquele amor e reavaliando seus próprios conceitos à medida que leem as anotações. Junto com os diários, havia ainda uma caixa com os pertences de Robert (que foram enviados após sua morte, à seu pedido, à Francesca); um livro de fotografias (único que ele publicou na vida) intitulado “Four Days” e dedicado à sua musa inspiradora; e um pedido da mãe deles para que suas cinzas fossem jogadas do alto de uma das pontes do condado, de onde também foram atiradas, pela própria Francesca, as cinzas de Robert.

Nota: “As pontes de Madison” recebeu uma indicação ao Oscar, na categoria de Melhor Atriz (Meryl Streep), duas indicações ao Globo de Ouro, nas categorias de Melhor Filme - Drama e Melhor Atriz - Drama (Meryl Streep), e uma indicação ao Cesar, na categoria de Melhor Filme Estrangeiro.

Ficha Técnica
Título Original: The Bridges of Madison County
Gênero: Drama
Tempo de Duração: 135 minutos
Ano de Lançamento (EUA): 1995
Estúdio: Warner Bros. / Amblin Entertainment / Malpaso Productions Distribuição: Warner Bros.
Direção: Clint Eastwood
Roteiro: Richard LaGravanese, baseado em livro de Robert James Waller
Produção: Clint Eastwood e Kathleen Kennedy
Música: Clint Eastwood e Lennie Niehaus
Direção de Fotografia: Jack N. Green
Desenho de Produção: Jeannine Claudia Oppewall
Direção de Arte: Jay Hart
Figurino: Colleen Kelsall
Edição: Joel Cox

4 comentários:

pin hole disse...

Também adoro esse filme. Nada mal ter um sogro a cara do Clint, você tá é bem!
Assista, se puder, ao documentário A Ponte. É lindo, você vai gostar. São depoimentos e reflexões sobre quais razões levam tantas pessoas pularem da Golden Gates, famosa ponte em São Francisco.

Silvana Malta disse...

Seu Pithon é o maior gato, com todo respeito :)

Sobre o documentário, que dica bacana! Tô super curiosa. Com certeza, vou adorar. Tem em locadora?

Fernandamonteiroc disse...

sil, vc acredita que quase morri de tanto chorar quando vi esse filme(há trocentos anos atrás, em vhs ainda!). será que se eu revesse ele ainda iria me emocionar tanto?
e também fiquei interessada neste documentário que carol falou. a pergunta que não cala: será que tem um locadora?
beijão querida!

Silvana Malta disse...

Sério? Que linda! Eu mooooorrrro de chorar toda vez que assisto. Tenho ele aqui, em DVD, original. Se quiser tirar a dúvida, posso te emprestar. Sobre o documentário, ainda não tive tempo de procurar. Assim que tiver alguma informação, te digo. Um beijo! E que saudade!